Você conhece o seu evangelizando?
(Lucia Moyses –
Educadora)
Tempos atrás recebemos uma carta de uma evangelizadora do
interior do Nordeste, na qual
falava-nos das suas dificuldades com a tarefa
da Evangelização. Pedia-nos, também, sugestão de
livros espíritas infantis e
terminava solicitando-nos o envio da programação que utilizávamos,
em
Niterói, com as nossas crianças.
Pedidos como esse último são muito
comuns, principalmente por parte de evangelizadores
novatos. Ainda não
tiveram tempo para perceber que o que funciona para um determinado grupo
de
crianças ou jovens, pode não funcionar para outro.
Foi observando esse
fenômeno que os psicólogos da aprendizagem chegaram à conclusão de
que o
conteúdo e a forma de ensinar devem se adequar aos alunos. E essa adequação só
se faz
quando se conhece o contexto em que se realiza o processo de ensino
–aprendizagem.
Por isso é que se diz que quem evangeliza precisa conhecer, e
bem, o evangelizando. Tudo
influencia na aprendizagem: a idade, o nível de
escolaridade, o nível sócio-econômico, o tipo de
família (sua estrutura, sua
forma de encarar a Evangelização, o Espiritismo), isso, sem contar com
a
bagagem espiritual que cada um traz.
Estudiosos dos processos de aprendizagem
consideram tão importante se conhecer o alunos
que chegam mesmo a afirmar que
só há verdadeira aprendizagem quando se toma como ponto
de partida aquilo que
o aprendiz já conhece. E essa afirmativa vale também para o adulto. Você,
por
exemplo, quando encontra alguém que começa a explicar um assunto novo usando
palavras
desconhecidas, também não fica sem entender direito aquilo que foi
explicado? Agora, imagine a
criança!
Às vezes o problema não consiste nas
palavras, mas no significado que o aluno lhes atribui.
Pode acontecer de você
as estar empregando pensando em uma coisa e os alunos estarem
pensando em
outra. Uma situação que ilustra bem esse fato relaciona-se com a idéia
de
“revelação”. Se você experimentar perguntar para as crianças o que é
revelação, terá,
provavelmente como resposta que é “quando você leva o filme
para fazer a fotografia”. Esse é o
significado mais presente no seu cotidiano
para aquela palavra.
Outras vezes, o problema é a interpretação que ele dá ao
que você fala. À medida que ele vai
ouvindo, vai elaborando o seu pensamento,
e esse é fruto das suas vivências, das suas
observações. Desta forma, pode
acontecer de haver uma grande distância entre o que você quis
dizer e o que
foi apreendido. Vejamos um exemplo: o assunto da aula aborda a obediência;
a
evangelizadora afirma, em tom conclusivo, que os pais devem “corrigir” os
filhos. Se a criança é
espancada, ou se é submetida a atrocidades físicas ou
ainda a fortes constrangimentos
psicológicos, ela pode achar que “corrigir” é
isso, que seus responsáveis estão certos em
proceder daquele jeito. Assim,
porque desconhecia a realidade das suas crianças, a
evangelizadora perdeu uma
boa oportunidade de ajudá-las.
Trabalhar ignorando a realidade dos alunos
pode, por vezes, ser desastroso, chegando mesmo
a provocar-lhes dores e
sofrimentos desnecessários. Nas nossas trocas de experiências
com
evangelizadores, já vimos muitos deles se darem conta disso, ainda que
tardiamente.
Exemplificaremos com um caso que nos foi narrado. Certa
evangelizadora, abordando o tema
“família”, fez cartazes e trabalhou o tempo
todo considerando apenas a família dita “bem
estruturada”. Aquela em que há
pai, mãe e filhos; o pai trabalha fora; sai de casa de terno e
gravata, com
uma pasta na mão; os filhos têm seu próprio quarto, com uma cama, mesinha
de
cabeceira, etc; a família se reúne, à noite, à hora de jantar em torno da
mesa e todos conversam.
Não é difícil se perceber tratar-se de um modelo
ideal de família de classe média. Acontece que
turma da referida
evangelizadora criança alguma tinha uma família como aquela. Havia
crianças
pobres, filhas de pais desempregados, filhas de mães solteiras ou de
mães abandonadas pelos
maridos; crianças criadas pelos avós, ou que tinham
padrasto. Ninguém ali se enquadrava nos
moldes apresentados. É muito provável
que naquela dia as crianças tenham voltado para a casa
com a sensação de que
havia algo de muito errado com elas, sentindo-se envergonhadas ou,
quem sabe,
até mesmo culpadas por uma situação na qual elas eram apenas vítimas.
Para
evitar tudo isso, e tentar aprimorar o ensino, o melhor caminho é você conhecer
todos os
seu evangelizandos. Procure saber como vivem, conheça suas histórias
de vida, seus sonhos,
seus temores... Uma boa forma de consegui-lo é manter,
durante suas aulas, um diálogo aberto.
Faça perguntas, peça que contem sobre
eles próprios. À medida em que for ensinando, conte
casos, traga histórias e
vá proporcionando chances para que eles se comparem com os
personagens
trazidos. Relatos são sempre bem-vindos.
Há ainda outras coisas que você pode
fazer, como visita às casas dos evangelizandos,
passeios com a presença de
alguns pais e reuniões de confraternização com a família. Se são
filhos de
trabalhadores da Casa, é ainda mais fácil: aproxime-se dos pais e converse sobre
seus
filhos.
Conheça-os melhor e, em pouco tempo, passará a vê-los como
filhos do seu coração.
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Flávia Peruci